Futuro retrô


 
Dizem por aí que favela tá na moda, fitinha do nosso Senhor do Bonfim tá na moda, tomar açaí tá na moda, pedalar tá na moda, não comer tá na moda, ter opinião tá na moda. Eu fico aqui pensando com  os meus botões, mas que diabos! Eu sempre tive na moda e não sabia? A minha marca é tão autentica quanto a cara lavada do trabalhador brasileiro que come sua marmita no banheiro, com vergonha de fazer feio na frente dos outros funcionários. Meu suor nunca teve etiqueta. Sem marca, sem dinheiro, sem certeza. Eu nunca soube que andava na moda. Para mim, a desgraça foi sempre uma vizinha reconfortante. Na moda, eu? Mas que nada meu amigo. Umas bobas palavras em jornal da moda [escritas por uma mão bem cuidada, de alguém que nem acordou tão cedo quanto eu e já tinha a roupa passada, antes de beliscar uma torrada e sair tomando o suco de laranja à procura de um táxi] são apenas umas bobas palavras em um jornal da moda. Dizendo que moda é a invenção da vida que a gente leva. Das poucas certezas que carrego comigo, a única coisa que posso afirmar é que a moda (aquela que eu sei porque observo de longe) é mesmo aquilo que o dinheiro compra caro. Uma logo estampada no carro, na bolsa, no salto, um nome qualquer que custou os olhos da cara. Não sei, meu amigo. Assim como se marca os bois com brasa quente, a moda marca os endinheirados com idiotice e despreparo. Para a vida e para a morte. Vivem da vida que acreditam que levam, sempre muito orgulhosos dos “problemas” que precisam resolver, porém apavorados com a idéia de não existir. O medo de não ser. Nesse caso, a moda é apenas um retrocesso. O futuro retrô da minha, da sua, da nossa sociedade capitalista. Sempre ditando o que pode e o que não pode. Inventando o futuro com peças do passado, cobrando caro por um pedaço de metal, uma sigla que significa qualquer bobagem. Uma maneira de “ser” sem ser absolutamente nada. Uma das maiores cafonices da sociedade moderna: essa tal de moda.
 

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