Sem Culpa



Às vezes, eu escrevo distante do meu coração. Talvez pra escrever bonito ou somente para preservar as pequenas dádivas que guardo dentro do peito.
Mas hoje eu vou abrir o peito e declarar meu amor ao meu mestre maior que mudou minha vida, minha cabeça, meu mudo e minha profissão.

Ariano Suassuana.

Os amigos já estão de saco cheio de saber e nem aguentam mais me ouvir falar dele. Mas a verdade é que eu amo O ARIANO. Sua cultura afiada, sua mente afiada, sua inteligência afiada, sua escrita afiada, sua teimosia afiada, suas idéias afiadas, seu respeito por si mesmo afiado. Sua grandeza, sua generosidade e sua experiência. Talvez eu não tivesse me formado em jornalismo se, aos 17 anos de idade e escritora mirim do Diário de Pernambuco (o Jornal mais antigo em circulação na América Latina), não tivesse entrado no gabinete do secretário de cultura do estado de Pernambuco para entrevistá-lo.

Eu – Senhor Ariano, o senhor não acha que é muito radical dizer que o Paulo Coelho é um péssimo escritor?

Ariano – Não. Não acho não. Você ainda é muito nova, mas antes do Paulo Coelho falar as besteiras que ele tenta escrever, o Malba Tahan já fazia isso há muito tempo e com muita mais vigor, sabedoria e boa escrita. Mas você com certeza não conhece o Malban Tahan.

Eu – Claro que conheço ele escreveu O HOMEM QUE CALCULAVA. Mas me diga Ariano, o Senhor já leu um livro do Paulo Coelho?

Ariano – Não consegui passar da página número 7 (a primeira como todo mundo sabe!), porque ele escreve muito mal e comete crimes a língua portuguesa dos quais eu sou incapaz de perdoar.

Eu – Então o senhor não acha que é meio um Dom Quixote de uma causa perdida? Afinal, o Paulo Coelho hoje é bastante conhecido. E o senhor ganhou só um prêmio em Portugal, esse ano.

Ariano – Mas quem disse que eu quero ser conhecido? Se eu quisesse teria vendido os direitos do Auto da Compadecida a tv Globo, nos 80, quando ela tinha um contrato com a MBG/Ariola para fazer do meu livro uma novela. Eu deixei. Onde já se viu colocar música internacional no meu Chicó? Não pode. Não deixei e não deixo.

Eu – Então, o Senhor prefere ser lido por 1000 pessoas no estado de Pernambuco do que ver seu nome aparencendo nos créditos da novela das 8?

Ariano – Prefiro, eu sou nordestino. Ou as coisas são do meu jeito ou não são. Quem já se viu colocar aqueles atores cariocas fazendo sotaque de nordestino? Não deixo e pronto. Sabe de uma coisa, eu vou lhe dizer uma coisa - na minha cabeça o mundo dividi-se em duas partes: uma dos que concordam comigo e a outra dos equivocados. Você conhece meus textos?

Eu - Sim, eu fui na peça do Auto da Compadecida lá no teatro Valdemar de Oliveira e depois tive que ler o santo e a porca para um trabalho do colégio.

Ariano – E você gostou?

Eu – Sim.

Ariano: Então pronto. Eu já tô feliz. Minha mulher diz que tudo que eu escrevo é maravilhoso. Mas você nem me conhece. Viu só. Eu fico vaidoso já em excesso.

Está aí uma pequena parte do que foram aquelas 6 horas que eu passei naquele gabinete que ficava à frente do Rio Capibaribe. Eu saí daquela sala encantada com a aula de cultura, a graça e a generosidade de Ariano. Aquele que, em uma tarde, me fez orgulhosa do meu mundo, da minha geografia, do meu sotaque e da minha gente.

Corri pra casa, devorei todos os livros do Ariano e passei a ir a todas as suas aulas espetáculos (todas que pude comparecer). Ainda é incrível encontrá-lo. Ele é simplesmente o máximo. Faz mais ou menos 3 anos que eu o vi naquele shopping que era de decoração e que virou point do Leblon, Rio Design. Eu estava sentada esperando uma mesa em frente ao gula-gula e ele vinha descendo as escadas rolantes.
Dei um salto e um berro: MESTRE!!!!!!! Beijei sua mão e a de sua esposa, pedi benção aos dois e foi jantar feliz da vida.

Eu tenho o maior amor do mundo por este mestre. Ops. Mestre - com letra maiúscula.

Nota da Autora.

1 – durante a minha entrevista, eu era uma garota mimada que se achava o máximo por atacar o Ariano. Eu só reproduzi o que eu ouvi sobre ele durante minha pesquisa de campo antes de entrevistá-lo. Em outras palavras, uma babaca.

2 – O Auto da Compadecida só chegou à tv brasileira 4 anos depois desse encontro. Com muitos atores pernambucanos, nenhuma música internacional e um acordo entre Ariano, Guel Arraes e Luiz Fernando, na casa do Ariano, enquanto ele tomava sua sopa no jantar (que é sempre servido às 6 da tarde): - Alguém naquela mesa ia ter que ceder e claro não seria o Ariano.

3 – Todos os meus livros do Ariano são autográfados e no colégio, eu fui convidada a homenageá-lo com uma poesia de minha autoria.

4 - Fotos do Peramblogando.

2 comentários:

Patricia disse...

Que post delicioso Lele! E que honra ter conhecido o Mestre ao vivo e a cores!
Tembém adorei o novo design do blog, muito mais fácil de ler...sua casa está ainda melhor! Um beijo.

Lilian disse...

Fantástico o flash que a entrevista deu na personalidade maior que o mundo do escritor. Admirável seu compromisso com a autenticidade, a determinação em não se deixar corromper.
Me deu um comichão de ler outras obras dele.

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