Pelas ruas que andei...

O Recife que mora dentro de mim é cidade de portas abertas e lua por pontes e ruas desertas, como a solidão num dia de sábado e feriado.
O Rio que vive dentro de mimé como uma vila de pequenos conhecidos, que todos os dias dizem bom dia! e lhe chamam pelo nome.
No meu Recife as pessoas são ranzinzas e extremamente emocionais, tão quanto como distintas.
No Rio que não é meu mas me pertence por lealdade e amor discreto, as pessoas andam de esquina em esquina, saltando de solidão em solidão - como no compasso do 584 que atravessa a Urca para entrar Copacabana adentro.
No Recife meu berço foi o Cristo, meio desmantelado pelo acaso do meu nascimento. Sem destino certo, me criei no percalço da estrada. Na vida cheia de aventura e descobertas, amando cada pessoa que me fosse honesta. Contendo cada lágrima que não merecia enxugar. No Rio aprendi a ser eu mesma, amar as cores e agradecer por mais um dia. Na jornada do ir e vir, sem muito acesso a luxo e descanso. Quantas idas e vindas nas galerias da avenida atlântica, entre as escadarias da estação Arcoverde, minha ponte de chegada. Meu altar de partida. Mais um dia de vida, e mais nada.
No Recife Suassuna me ensinou a amar o belo, com o toque do modesto. Me deu chão pra entender o absoluto e insólito do concreto. E meu deu o Armorial para representar a minha vida.
O Rio me deu solidão em cada esquina, mas me deu chão para cada sonho.
As asas quem me deu foi o Recife, nas músicas de Capiba, nos versos de Bandeira.
O Rio me deu a boemia da Lapa, para onde eu ia encontrar a Cláudia no Odisseia.
O Recife não foi modesto e não me poupou da alegria dos amigos sinceros.
O Rio me foi mais reservado. Mas meu deu o gesto completo, a cada sessão de incerteza, o passo secreto de cada jogada era revelado à revelia de minha capacidade, ou da falta dela.
O Rio não era mais uma cidade, era a cidade adormecida dos meus sonhos de criança. Era o tablado me chamando pra atuar, era Ipanema me dizendo que o Letras era mesmo o meu lugar.A cada dia de volta, a Alberto de Campos me cantava cantigas de ninar, porque era tão bom estar de volta a minha casa. A casa que nunca vou deixar de amar, meu apartamento 404, de frente para o corcovado e de costa para Lagoa para homenagear o mar.
Mas era para o Recife que eu teimava em voltar, porque não existe nada mais importante na vida doque poder beber da fonte de sua existência vez por outra. Recife sempre foi meu bebedouro de renovação, de sonho e paixão. Onde cultura e arte caminham juntas e em cada detalhe, em cada música, existe sotaque, carne de charque e palavras cheias de expressão e popularidade.
Mas era o Rio que eu não nunca deixei de amar que me levava a lugares jamais pensados, jamais vividose tão pouco sonhado. O galeria do João e do Guty, as boates da Bia - que eu odiava visitar. A minha aventura de ser. O meu próprio experimentar sem culpa. O meu amadurecer. Porque eram as ruas do meu Recife que me levavam a caminhar no Rio. Mesmo só ou acompanhada. Sempre foram as músicas que meu Recife me ensinou a cantarque bêbada, nas minhas noitadas, eu teimava em escutar. Porque o Recife tá dentro de mim e é ele que acalenta meus sonhos enquanto durmo nos braçosdo Jardim Botânico. Porque foi o Recife me deu asas para chegar aqui, mas o Rio foi mesmo quem me ensinou a sonhar.

Da Crise do Mundo para a Crise dos Mudos.

Vou fazer um slide show para você. Está preparado?
É comum, você já viu essas imagens antes.
Quem sabe até já se acostumou com elas. Começa com aquelas crianças famintas da África. Aquelas com os ossos visíveis por baixo da pele. Aquelas com moscas nos olhos.
Os slides se sucedem.
Êxodos de populações inteiras. Gente faminta. Gente pobre. Gente sem futuro.
Durante décadas, vimos essas imagens. No Discovery Channel, na National Geographic, nos concursos de foto. Algumas viraram até objetos de arte, em livros de fotógrafos renomados. São imagens de miséria que comovem. São imagens que criam plataformas de governo. Criam ONGs. Criam entidades. Criam movimentos sociais. A miséria pelo mundo, seja em Uganda ou no Ceará, na Índia ou em Bogotásensibiliza. Ano após ano, discutiu-se o que fazer. Anos de pressão para sensibilizar uma infinidade de líderes que sesucederam nas nações mais poderosas do planeta.
Dizem que 40 bilhões de dólares seriam necessários para resolver o problemada fome no mundo.
Resolver, capicce? Extinguir.

Não haveria mais nenhum menininho terrivelmente magro e sem futuro, em nenhum canto do planeta. Não sei como calcularam este número. Mas digamos que esteja subestimado. Digamos que seja o dobro. Ou o triplo. Com 120 bilhões o mundo seria um lugar mais justo. Não houve passeata, discurso político ou filosófico ou foto que sensibilizasse. Não houve documentário, ONG, lobby ou pressão que resolvesse.

Mas em uma semana, os mesmos líderes, as mesmas potências, tiraram dacartola 2.2 trilhões de dólares (700 bi nos EUA, 1.5 tri na Europa) parasalvar da fome quem já estava de barriga cheia. Bancos e investidores. Como uma pessoa comentou, é uma pena que esse texto só esteja em blogs enão na mídia de massa, essa mesma que sabe muito bem dar tapa e afagar.

Se quiser, repasse, se não, o que importa? O nosso almoço tá garantido mesmo...
Texto atribuído ao Neto, MENTOR MUNIZ NETO, diretor de criação e sócio da Bullet, uma das maiores agências de propaganda do Brasil, sobre a crisemundial.

E deixa o carnaval pra nunca mais.

Eu e essa minha cabeça de maluco. Não dá para tá por fora que quero entrar, se tô dentro quero sair. Vai lá me entender... mas o difícil mesmo é deixar de ser o que é ser você. E não tem nada de complicado. O seu aquário vai sempre fazer falta quando vc sair pra nadar no mar. Não tem jeito. É mesmo assim. Há alguns anos atrás, (ahahahhahaa), eu vim ao mundo com 8 meses de vida - vc sabe que eu odeio esperar né? Ou é agora ou nunca mais. Aí pronto, de quebra acabei com o carnaval de meia dúzia de gente e cresci desacreditando nessa festa maluca, com milhões na rua (o número não é apelo estético não, eu nasci em RECIFE). Odeio multidão, sempre odiei. Não vejo nenhum prazer em morrer tostada ao sol, esbarrando em um monte de bêbados cheirando a suor e cerveja - a chuva vc sabe, só aparece na música do Caetano.
Porém, desde que Recife não é mais meu chão e que o calor deu lugar ao inverno, comecei a sentir falta das pessoas falando que o ano só começa em março e fazendo planos para o carnaval ao meu redor. Tô meio perdida, porque não ter carnaval é meio como não ter o calendário completo. É como deixar o verão para mais tarde. Ou para nunca mais. É como não poder ser vc mesma, ou não ser como todo mundo num mundo que pertence a todos. Agora não me sinto como todo mundo, mas o mundo que aqui pertence a todos desconfio que não seja meu. Ou tão meu assim. O carnaval não vai chegar. Não vamos ver a Ivete na TV e eu nem vou saber quem ganhou na sapucaí esse ano, pelo menos não antes de ler no jornal. O carnaval sempre pode esperar, era assim que eu pensava, mas deixar ele pra mais tarde é como deixar uma lacuna no meio do meu dia. É como ter um verão sem sol para brilhar.
Como eu vou viver sem ouvir o meu frevo passar? Eis que viva e sobreviva dentro de mim, faz parte do mundo que ainda é meu, porque é de onde eu vim, mas que reviva onde nasceu e que brinde o coração de todas as pessoas que o respeitam e o pertencem. E a todos os foliões que vão brincar, que brindem pensando na colombina que não vai ver seu pierrot passar. E que desçam as ladeiras de Olinda cantando ao som do maracutu encarnado cantigas de outrora e que serão para todo sempre agora porque o carnaval, eu já sei, não pode esperar.
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...